Incêndios na Argentina geram cautela no segundo maior corredor logístico do RS

Possíveis reflexos no transporte internacional de cargas deixa em alerta setores que operam com comércio exterior na região mais atingida pelas queimadas

A menos de cinco quilômetros de onde opera o posto de comando formado para combater os incêndios que se alastram por Santo Tomé, na Argentina, na divisa com São Borja, opera o segundo maior corredor logístico do Rio Grande do Sul, com movimentação superior a US$ 6,6 bilhões em 2021. 

Por lá, passam, em média, 8,2 mil caminhões mensalmente, com 65% do total de cargas anuais, concentradas nos setores automotivo e de máquinas e equipamentos agrícolas, com outra fatia considerável em produtos perecíveis como frutas, legumes e pescados.   

Os reflexos da situação no país vizinho, que respondeu por US$ 11,8 bilhões das exportações nacionais, com 35,8% do fluxo registrado na ponte internacional São Borja-Santo Tomé, ainda não são sentidos, mas deixam em alerta alguns segmentos, empresas e despachantes que dependem do comércio exterior entre os países.   

Diretor de Relações Internacionais da Associação Comercial e Industrial de São Borja (Acisb) e representante da empresa UniMercosul, Enedir Ramires reforça que o olhar é de cautela. Nos próximos dias, relata, terá início o escoamento da safra de alho e cebola, cuja celeridade nos processos aduaneiros é essencial para que não ocorram situações de cargas perdidas.  

Com bloqueios de estradas, a exemplo dos registrados entre a sexta-feira (18) e o domingo (20) na Argentina, comenta Ramires, é natural que outros produtos de fluxo mais contínuo, a exemplo de maçãs, peras e peixes, como o salmão, com volumes mais expressivos, tenham ficado represados nos locais de saída, a maior parte no Chile.  

— A ponte (São Borja-Santo Tomé)tem por característica a agilidade para atrair segmentos perecíveis e esse tipo de carga seria bastante impactado com novos bloqueios em rotas de entrada por precisar trafegar logo e possuir prazo específico de entrega — resume.   

A alternativa, avalia Ramires, passaria por redirecionar as rotas de produtos refrigerados e frutas frescas, que juntos acumularam movimentação de US$ 23,2 milhões em 2021, até Bernardo de Irigoyen, na fronteira com o município de Dionísio Cerqueira, em Santa Catarina. Porém, o local conta com estrutura de despacho aduaneiro precária, salienta. 

Fluxo 

No final de semana passado, a orientação recebida por motoristas que chegaram até a ponte São Borja-Santo Tomé era a de evitar seguir viagem, em razão da proporção dos incêndios que passaram a colocar em risco as margens da Rota 14, em Santo Tomé. Trechos dessa rodovia, que liga Posadas, na província argentina de Missiones, a Buenos Aires, também são bastante utilizados nos itinerários que levam diversas cargas da indústria de transformação até o Chile e países do Mercosul.  

Apesar do cenário, José Vazzoler, gerente-geral da Mercovia, concessionária do Centro Unificado de Fronteiras (CUF) instalado neste corredor logístico, afirma que não foram registradas quedas no fluxo internacional de cargas. Segundo ele, a média acima de 8 mil caminhões mensais foi mantida em janeiro e fevereiro deste ano.    

Atraso em entregas de máquinas e equipamentos 

Enquanto aguarda pelos trâmites de despacho aduaneiro em Santo Tomé, o caminhoneiro autônomo Fernando Ribeiro, de Passo Fundo, que leva tratores brasileiros da New Holland para o Chile, relata que teve problemas na Rota 14 em razão dos incêndios na sexta-feira passada. Segundo ele, as chamas levadas pelo vento de um lado a outro da rodovia atingiram um veículo que transportava soja e o trânsito ficou interrompido, o que atrasou a programação original. 

Maior comprador de máquinas e equipamentos agrícolas brasileiros, a Argentina também possui algumas fábricas de autopeças e motores. Esses componentes fazem o fluxo inverso, são enviados ao Brasil para serem montados aqui. No intercâmbio, o risco, analisa o presidente do Sindicato de Máquinas e Implementos Agrícolas RS (Simers), Cláudio Bier, é justamente o atraso nas entregas.  

A mesma lógica, comenta Bier, vale para a indústria automotiva. Neste setor, o montante movimentado ao longo do ano passado, na soma de autopeças, componentes e veículos, somou US$ 2,5 bilhões, somente nas exportações brasileiras para a Argentina.  

Nas máquinas, de acordo com o dirigente, é muito comum que as compras sejam efetuadas com pouco tempo de antecedência para o início das safras. Sendo assim, o agravamento da situação na Argentina poderia ocasionar cancelamentos ou impossibilidade de entregas dentro dos prazos.  

— Esse é o grande problema que pode causar. Depois de colhida a safra, não se compram mais máquinas — argumenta. 

Bier explica que o Rio Grande do Sul responde por 62% da produção desse setor no país. Em contrapartida, representa somente 11% do mercado nacional, ou seja, é dependente das vendas externas e para outras unidades da federação.  

Fonte: GZH

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